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17/01/2022 - 17h55

Pode a empresa dispensar por justa causa o empregado que recusar a vacina?

Caso recente ocorrido na Justiça do Trabalho é analisado pelo advogado Thiago Lages

 

 

 

Por Thiago Lages*

 

 

Empregado que se recusar a tomar a vacina contra a covid-19 poderá ser dispensado por justa causa e ter o pagamento reduzido das verbas rescisórias. Esse foi o entendimento mantido pelo ministro Barroso, do STF (Supremo Tribunal Federal), após suspender diversos trechos da Portaria emitida pelo Governo Federal em 1º de novembro proibindo a exigência, pelas empresas, do comprovante de vacinação de seus empregados.

 

Trata-se de suspensão de vários trechos da Portaria, cuja finalidade era inibir que pessoas que não são adeptas à vacinação contra a covid-19 fossem dispensadas por justa causa, devido à recusa em se vacinar e comprovar, bem como a possibilidade de empresas exigirem, no ato da contratação, a comprovação de que o candidato à vaga esteja com a vacinação em dia.

 

Já vinha se consolidando em alguns tribunais trabalhistas que, em casos de recusa à vacinação, a seria possível a dispensa por justa causa. Inclusive, foi o que decidiu uma Vara Trabalhista do interior de São Paulo. Em uma ação que discutia a validade da justa causa, o juiz daquela localidade analisou o caso e rejeitou o pedido de reversão da justa causa da empregada, sustentando que "a vacina é a única e perfeita solução de controle de uma epidemia do porte da covid-19" e que "a pandemia da covid-19 no Brasil já infectou mais de 15 milhões de pessoas".

 

Diante desse entendimento, o juiz não acolheu os pedidos da empregada, mantendo a justa causa por não ter a trabalhadora se vacinado, especialmente quando a empresa proporcionou meios para a vacinação de seus empregados. A empregada recorreu da decisão, mas também não teve amparo no TST (Tribunal Superior do Trabalho), que deu razão à empresa e manteve a justa causa, reconhecendo a importância da imunização no ambiente de trabalho e classificando a conduta da empregada como inadequada, devido à crise mundial espalhada pela doença.

 

A decisão proferida no processo ainda não é definitiva, pois a empregada poderá recorrer ao TST e, após, ao próprio STF, cabendo ainda discussão sobre a validade ou não da dispensa por justa causa em razão da recusa à vacina. No entanto, a decisão do ministro Barroso, ao suspender os trechos da Portaria que proibia a dispensa por justa causa, pode sinalizar que, de fato, o Supremo, ao analisar casos como esse, conservará decisões como a do Tribunal de São Paulo, que manteve a decisão por justa causa da funcionária não vacinada.

 

A decisão do Ministro é recente, mas serve como fortalecimento ao entendimento que já vinha ganhando força nos principais tribunais brasileiros, podendo o empregador ter ampla liberdade de exigir que o seu funcionário esteja em dia com a vacina sob o risco de ser dispensado.

 

Diversos órgãos públicos e empresas privadas estão adotando medidas cada vez mais rígidas com o fim de desencorajar aqueles que são contrários à vacinação e decidiram não tomar a vacina por questões pessoais e ideológicas. Contudo, a preocupação dos empresários se dá, também, diante do risco de, havendo contaminação do empregado no ambiente do trabalho, ser caracterizada doença decorrente laboral, atraindo para a empresa o risco pelos efeitos que causar no empregado e em sua família.

 

A longo prazo, levando em consideração o tamanho e a gravidade da pandemia e o impacto direto em diversos segmentos, o mais provável é que a vacina da covid-19 entre para o calendário anual de vacinas ofertadas pelo SUS (Sistema Único de Saúde), de forma que a exigência pela manutenção do cartão de vacinação se estenderá por longos anos. Isso implica que empresas passem a exigir que candidatos às vagas de emprego apresentem o cartão de vacinação em dia, podendo a falta dele ser motivo de desclassificação do candidato.

 

Mas isso não seria interferir no direito de escolha do indivíduo? As recentes decisões na Justiça do Trabalho vêm sido no sentido de que o direito coletivo está acima do individual nesse cenário, pois a imposição aos indivíduos para que se vacinem é uma medida necessária à preservação da saúde dos brasileiros e manutenção da economia do país.

 

Atualmente não há legislação clara e expressa sobre a possibilidade de o empregador exigir a vacina ou até mesmo dispensar por justa causa o empregado que se recuse a se vacinar. Entretanto, o que temos visto é que há grande chance de o Tribunal firmar entendimento, nos próximos meses, no sentido de que a exigência de vacinação seja legítima por parte dos empregadores, dos quais uma parcela considerável já se posicionou no sentido de adotar essa exigência.

 

Importante dizer que é preciso cuidado por parte dos empregadores, pois em que pese a expectativa de que a exigência seja válida, por outro lado, deve haver cuidado extremo para não expor os empregados que se recusam a tomar o imunizante, de forma a não os constrangê-los perante outros funcionários, sob risco de serem demandados por danos morais.

 

Diante desse cenário, o mais recomendado é que os empregadores divulguem informações sobre a importância da vacinação, promovam programas e campanhas de conscientização, incentivando e formalizando todas as recomendações e protocolos preventivos com o objetivo de demonstrar a boa-fé e a responsabilidade da empresa com seus funcionários.

 

Em situações extremas, caso os empregadores que optem em realizar a dispensa por justa causa por recusa à vacina, vale ressaltar o risco de discussão sobre o assunto no Judiciário, uma vez que somente haverá uma segurança maior sobre o tema quando os tribunais se posicionarem de forma mais contundente sobre o assunto, como tem sido sinalizado.

 

*Thiago Lages é sócio e advogado da área Relações de Trabalho e Consumo na Andrade Silva Advogados

 

 

Foto de abertura: Divulgação/Andrade Silva Advogados