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22/07/2022 - 10h00

Semana de quatro dias de trabalho e sua relação com um mundo mais sustentável

Número de horas trabalhadas não pode ser régua moral de quanto valemos, diz Glaucimar Peticov em artigo

 

 

Por Glaucimar Peticov*

 

 

O que você faria se trabalhasse apenas quatro dias na semana? Usaria esse novo dia livre para estudar, cuidar da casa, fazer trabalho voluntário? Essa nova possibilidade começa a ser realidade em países como Bélgica, Islândia e, mais recentemente, no Reino Unido, que decidiu testar a jornada de trabalho reduzida. Esse tema está na pauta de líderes e CEOs do mundo todo, como ocorreu em Davos, na Suíça, durante o Fórum Mundial Econômico deste ano.

 

Para seus defensores – e, entre as lideranças mundiais, não são poucos! – uma semana de trabalho de quatro dias é uma necessidade por razões ambientais, econômicas e de saúde das pessoas. Além disso, ter um tempo a mais para estudo e requalificação ultrapassa os benefícios individuais e gera ganhos para toda a sociedade, já que muitos dos futuros postos de trabalho, especialmente os ligados à sustentabilidade e à transição para uma economia mais verde, exigem ao menos um grau mínimo de requalificação.

 

Entre os desafios para essa implementação está o de medir a produtividade dos funcionários. Para Aidan Harper, coautor do livro The Case for a Four Day Week, países que trabalham menos tendem a ter maior produtividade.

 

Durante a pandemia, refletimos e ressignificamos o tempo. Quem não teve sua rotina pessoal e de trabalho alterada? Mesmo entre tantos desafios, percebemos os benefícios de investir nosso tempo na família, na nossa casa e em nós mesmos. Trabalhar de casa, inclusive, durante esse período, foi o principal fator que motivou a pressão crescente por uma semana de trabalho mais curta. Grandes empresas entenderam que as equipes continuam a entregar e cumprir suas metas, mesmo quando os próprios funcionários são corresponsáveis pela manutenção da própria rotina.

 

Com o avanço da vacinação e a retomada das atividades, as empresas brasileiras estão buscando um meio termo entre o home e o office com a adoção de um modelo híbrido. No setor financeiro, por exemplo, o Bradesco, que tem cerca de 87,5 mil funcionários, foi o primeiro banco de grande porte a assumir o compromisso de adotar essa forma de trabalho após a pandemia. E há o entendimento de que, em algumas áreas, essa modalidade passou a ser relevante para a atratividade e a retenção de talentos.

 

Mas para além do modelo, o futuro do trabalho nos apresenta a ascensão rápida e sólida do movimento 4 Days Week Global, criado por Charlotte Lockhart e pelo empresário e filantropo Andrew Barnes. Enquanto muitos relacionam o ESG (sigla para Ambiental, Social e Governança) apenas às questões ambientais, devemos lembrar que se faz sustentabilidade com pessoas. Com a semana de quatro dias estamos falando de um uso mais inteligente de outro tipo de “energia sustentável” – a nossa! Há quem diga que 2/3 dos e-mails de nossa caixa de entrada poderiam desaparecer sem sentirmos falta. Será mesmo que precisamos saber o que está acontecendo a cada instante?

 

Em muitos setores, a quantidade de horas trabalhadas chega a ser uma espécie de régua moral de quanto você vale como pessoa. Empresas que querem entrar nesse jogo devem começar mudando o jeito de cobrar de seus funcionários e colaboradores. O objetivo é olhar menos para as horas de trabalho como forma de monitoramento e mais para a qualidade da entrega.

 

A noção de flexibilidade passa por assumirmos que cada pessoa e setor pode ter necessidades diferentes. Para muitos de nós, saber os dias nos quais precisaremos de alguém para cuidar dos filhos, é importante. Ter opção e voz ativa na escolha da carga horária pode ser mais valioso que uma semana de quatro dias imposta de cima para baixo. Talvez, em um futuro cada vez mais próximo, vamos discutir não o número de dias, mas como distribuir 32 horas de trabalho da forma mais apropriada para a rotina de cada pessoa, lembrando que o simples tem se mostrado ser mais fácil do que o complexo.

 

 

*Glaucimar Peticov é diretora executiva do Bradesco

 

 

Foto: Divulgação/Bradesco