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20/07/2022 - 12h01

Quantos de nossos esforços são oferendas ao nada?

Em sua coluna mensal, Marcelo Madarász pede atenção ao arrependimento pelos excessos

 

 

 

Por Marcelo Madarász*

 

 

Provavelmente você já passou por esta situação ou conhece alguém que o tenha feito: esteve numa festa, num churrasco, almoço ou jantar e, após comer em excesso, usou a expressão: comi até passar mal. Outra cena que me vem à mente são os navios ou resorts com o sistema “all inclusive”, ou seja, comidas e bebidas já estão incluídas no preço e a probabilidade de se cometer excessos ou entregar-se ao “pecado” da gula é grande. Novamente o excesso traz o desequilíbrio. É muito comum quando a pessoa inicia uma dieta alimentar, ouvir de seu médico a sugestão de não frequentar rodízios, mas de preferência restaurantes por quilo, nos quais o preço a ser pago está relacionado à quantidade de comida ingerida. Aqui, além de um motivador a mais para se controlar, se toca também num dos órgãos mais sensíveis do ser humano: o bolso.

 

Para quem tem interesse em aprofundar esta reflexão sugiro uma leitura formidável: A cabala da comida, A cabala do dinheiro e A cabala da inveja, uma trilogia do rabino Nilton Bonder na qual ele explicita que a relação com a comida que ingerimos, com o dinheiro que ganhamos e com o ódio que sentimos pode revelar muito sobre quem somos. Há um provérbio talmúdico que diz: Uma pessoa se faz conhecer por seu corpo, seu bolso e sua ira.

 

Voltando à metáfora das refeições ou das situações de lazer nas quais a pessoa perde o limite e, apesar do gozo momentâneo, depois se arrepende pelo mal-estar do excesso, o que isso tem a ver com a dinâmica atual e, sendo mais específico, com o mundo dos executivos e colaboradores de empresas neste alucinante ano de 2022, com desafios enormes impostos ao homem contemporâneo?

 

Há uma avalanche de informações e, principalmente, de desinformações que nos bombardeiam segundo a segundo. Elas vêm de todas as fontes e parecem mísseis a nos perturbar: internet, redes sociais, grupos de WhatsApp ou similares, memos, jornais, revistas, televisão, etc. A pessoa entra quase que numa maratona com overdose de informações e os canais congestionam nosso sistema de percepção e de leitura e entramos num colapso.  A autocobrança para se estar plugado, online, ativo, à disposição, antenado, é inacreditável.

 

Quando ampliamos essa situação para além da vida individual, familiar, social e incluímos os elementos inerentes ao mundo do trabalho, das organizações, das metas a serem cumpridas, dos resultados, da pressão por eles, a situação beira o caos.

 

Sem querer ser o profeta do apocalipse, como um líder pode liderar pelo exemplo, se mal está conseguindo manter-se inteiro e saudável? Isso vai ao encontro das explicações em relação aos alarmantes índices de perturbações mentais, estresse, ansiedade, burnout e pandemia do desequilíbrio emocional. Não por acaso, pessoas e empresas acordaram para a necessidade da pausa, da meditação, do cuidar da respiração, dos cuidados ergonômicos, da interação social como antídoto da perturbação. Se a pessoa não se lembrar que é humana e que precisa cuidar do seu templo, que é seu corpo, sua mente e seu espírito, como ela respeitará o outro, como respeitará seu liderado? Vai lutar por resultados a qualquer preço? Vai impor e respeitar limites?

 

Esse longo caminho de reversão de algo que definitivamente não está bem deve passar obrigatoriamente pela auto-observação, observação do mundo ao seu redor, do outro, das dinâmicas com o outro e pela jornada de autoconhecimento e expansão de consciência.

 

Seja para os banquetes servidos, seja para as infinitas informações que nos chegam, é imperioso fazer escolhas. É obrigatório aprender a dizer não, fazer renúncias, escolher as batalhas. Para fazê-lo, é interessante conhecer seus objetivos, seu propósito e se perguntar se aquela determinada situação ou estímulo faz sentido ou se você está simplesmente embarcando num navio, quando na verdade o que você mais queria era permanecer no sofá de sua casa… Como sabiamente perguntou o rabino Nilton Bonder: quantos de nossos esforços são oferendas ao nada?

 

 

*Marcelo Madarász é diretor de RH para América Latina da Parker Hannifin

 

 

Foto: Marcos Suguio