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30/05/2021 - 17h04

Como liderar a diversidade?

É preciso legitimar a existência dos vieses inconscientes, afirma Silvana Mello neste artigo

 

 

 

 

Silvana Mello*

 

 

A pandemia entrou na casa das pessoas, no trabalho, na escola, na comunidade e invadiu literalmente espaços menos conhecidos. De repente, as pessoas tiveram contato com a família dos colegas, do líder, a rotina de cada um e aos poucos as pessoas foram se conhecendo mais, até porque a rotina da casa se misturou com a rotina do trabalho. Impossível não perceber as diferenças sociais, econômicas, padrões de conduta e formas de organizar a vida. A diversidade passou a ser realmente vista. Aquela funcionária que trabalha de forma tão produtiva, tem três filhos e sustenta a casa. Aquele funcionário excelente tem um filho autista e uma mulher negra que não consegue emprego.

 

Liderar a diversidade é um tema urgente e prioritário, um assunto que merece aprofundamento, não só no sentido visível e binário: homens e mulheres, brancos e negros, jovens e idosos, mas nos aspectos menos visíveis e mais sutis, como características pessoais, afinidades, possíveis vieses, crenças e valores. Como liderar tanta diversidade? Como inspirar pessoas que não pensam como você?

 

Guilherme Bara, em uma apresentação belíssima na TED de Campinas, conta a sua experiência como membro de uma equipe de trabalho e traz todos os vieses dos colegas na convivência com ele e com a sua particularidade, Guilherme é cego. Num primeiro momento, ele é visto pelo time como um coitado que não pode enxergar e tem uma série de limitações. Com o passar do tempo as pessoas notam que Guilherme faz uma série de esportes, incluindo os de aventura, tem esposa, tem um filho e vive a vida normalmente. Só depois de muito convívio a equipe passa a ver o Guilherme realmente, como ele é, com fortalezas e oportunidades.

 

Liderar a diversidade envolve considerar e legitimar a existência dos vieses inconscientes. Para quem não sabe, os vieses inconscientes foram validados em estudos cerebrais realizados em ressonância magnética. O projeto implícito fundado em 1998 por cientistas da Universidade de Harvard e Virginia nos Estados Unidos conta com pesquisadores do mundo todo que se debruçam sobre pensamentos e sentimentos que estão fora do controle das pessoas. Na verdade, estes estudos comprovam a existência de preferências escondidas no inconsciente e que influenciam as atitudes, as percepções, os julgamentos e as ações das pessoas sem que elas percebam que estão dando vantagem para um determinado aspecto.

 

Sabendo que os vieses inconscientes são estereótipos sociais que formamos fora da nossa própria consciência, como podemos liderar a diversidade? O primeiro ponto é reconhecer que todos os seres humanos têm algum tipo de viés e este certamente influenciará a forma de liderar e decidir sobre as pessoas. Discutir e trabalhar estes pontos com o time poderá ajudá-lo a trazer mais vida e consciência a um tema que é real.

 

Em um podcast com o técnico de futebol Jorginho concluímos que existe diversidade dentro da diversidade. No futebol, por exemplo, há jogadores de velocidade, de cadenciamento, jovem, experiente, aquele que veio da favela e tem muita dificuldade em se posicionar. Na empresa é a mesma coisa. Você pode ter na equipe uma mulher, outra que também é mulher, mas é negra, outra que é mulher, negra e mora na favela, e assim por diante. As histórias são parecidas, mas, em hipótese alguma são iguais. Fomentar uma cultura de respeito à singularidade pode ser uma saída. Respeitar não significa concordar ou discordar, significa simplesmente respeitar a singularidade do outro. No caso do Guilherme a sua singularidade é visível, mas poderia não ser.

 

Já deu para perceber que a diversidade requer gestão, não é mesmo? Mas, vale a pena ter diversidade na equipe ou na empresa? Estudos demonstram que a diversidade é um componente presente em equipes de alta performance, mas, mais importante que ter a diversidade no time, é saber como trabalhar com ela. Um time formado por pessoas com diferentes visões, valores, experiências, histórias de vida, habilidades e atitudes traz em si uma força e ao mesmo tempo uma vulnerabilidade. Um time forte traz para a mesa talento, competência, arrojo, mas também traz individualidade, excesso de confiança, arrogância, dificuldade em assumir uma perda, um erro e assim por diante. Então liderar a diversidade pode fazer toda a diferença para você e para o seu time.

 

*Silvana Mello é especialista em Desenvolvimento Humano e sócia-fundadora TCS – Talent Creative Solutions

 

Foto de abertura: Divulgação